Dizem que toda menina tem o sonho de casar. Casar de véu, grinalda, com flores nas mãos, igreja cheia, noivo
penteadinho e cheiroso esperando no altar, montes de amigas morrendo de inveja e lua de mel no Caribe.
Tinha até uma brincadeira que as meninas do primário faziam para descobrir como seria o casamento… será que eu
lembro?
No meio a gente colocava a idade que queria casar; nas linhas do lado esquerdo, os nomes de três paqueras; nas do
lado direito, os lugares para uma inesquecível lua de mel; em cima o seu destino financeiro: “R” de rica, “P” de
pobre e “M” de milionária; por último, era só colocar embaixo, a quantidade de rebentos que o casal teria: 1, 2 ou
3. Pronto, a sorte estava lançada! A partir do número 1 da seqüência de filhos, no sentido anti-horário, contava-se
item por item escolhido 25 (idade escolhida) vezes. A cada rodada de 25, eliminávamos uma escolha – a última opção
era a resposta para o seu futuro matrimônio.
Dá pra acreditar? Pior é que a mulherada fazia esta brincadeira umas cem vezes por mês. Tudo bem, eu admito, eu
também fazia. Não que eu quisesse casar, nunca quis e todo mundo é testemunha de que este não fazia parte dos meus
ideais femininos, mas era impossível não testar a fórmula mágica do casamento perfeito.
Acho que eu coloquei o nome de todos os meninos da escola, todos os namorados e todos os vizinhos bonitinhos que eu
tive. Nunca me importava quando ele dizia que eu seria pobre, contanto que eu passasse a lua de mel na Grécia.
Também não ligava quando caía o menino que eu gostava menos, contanto que a quantidade de filhos fosse 0 (eu adaptei
o método para a minha realidade, ao invés de 1,2,3 eu colocava 0,1,2 e começava a contagem a partir do zero).
Enquanto os meninos jogavam futebol, cabulavam aula e assistiam desenho animado, nós já estávamos desenvolvendo
táticas contra o P, pensando em controle mental de natalidade, planejando o roteiro de viagem e olhando diferente
para o vencedor dos três meninos selecionados. E foi assim que eu cresci, no meio de um universo feminino
extremamente forte que impregnava a minha alma com idéias de lar, família e sucesso financeiro.
Minha sorte foi uma rebeldia natural que eu nunca entendi de onde veio. Apesar de todo o complô para que eu
desejasse o
kit-felicidade, existia um desejo muito mais forte que dizia: 0,0,0 para filhos, foda-se se eu for pobre, lua de mel
é para quem casa virgem e eu não vou casar, vou no máximo morar junto. Depois disso ganhei uma bicicleta do meu pai
e parei de brincar de rabiscar o destino. Não é que o meu plano rebelde funcionou, mesmo assim? Quer dizer, mais ou
menos, apesar de morar junto há muitos anos, eu e o maridon temos uma escritura de declaração de união estável. Aí,
você me pergunta: que diabos é isto? E eu lhe digo: é culpa dessas minhocas que me enfiaram na cabeça a vida
inteira, misturadas com TPM e falta do que fazer. Mais tarde eu conto este episódio que aconteceu no dia 4 de
Janeiro de uns três anos atrás. É que hoje, também, é aniversário do meu sobrinho maravilhoso e eu vou lá comemorar
o primeiro ano da vida dele.
Assim que eu voltar, eu conto a história da tal da escritura. 😉