Sabe aquela cena clássica dos filmes adultos, mostrando um cara em um quarto, enfiado no computador, super desanimado… E aí ele pede uma pizza e aparece uma entregadora bonitona, vestida numa roupinha sexy e com uma meia-mussarela-meia-calabresa sobre os braços que levanta sua moral? Então, acho que acabei de viver a versão feminina de um troço desses aí…
Acordei um tiquinho pra baixo, sem vontade de sair da cama ou ver pessoas. Estava me sentindo borocoxo, sem graça e decidi passar o dia no quarto do hotel. Liguei o notebook, comecei a trabalhar ainda enrolada entre os lençóis, tocou a campainha. Levantei achando que ia somente avisar a camareira de que não seria necessário arrumar o quarto. Me enrolo no roupão de qualquer jeito só para atendê-la minimamente decente, abri a porta deixando só um pedacinho de rosto exibido entre o vão e me aparece um rapaz com uniforme branco, vários trécos eletrônicos pendurados na cintura e dizendo que veio consertar minha fechadura.
Achei estranho, já que o único problema que a porta parecia ter era um chiado na hora de abrir. Mas, se eu nem reclamei, como ele poderia saber?
Fiz a pergunta com meu péssimo inglês, ele perguntou se eu era brasileira, me contou que era venezuelano e mudamos rapidamente o assunto e a língua para o meu portunhol que o fazia sorrir. Eu também achei graça e, já que ele precisava trabalhar, pedi um minuto – antes de abrir-lhe a porta – pra ajeitar corretamente o laço do roupão e não parecer uma oferecida qualquer. Recolhi também minhas roupas espalhadas pelo quarto e escondi tudo dentro do armário. Só para não parecer bagunceira qualquer… Conferi no espelho a cabeleira e dei graças a deus por ter lavado o rosto e escovado os dentes logo que acordei. Mas era só para atender o rapaz decentemente e não parecer uma maluca qualquer… Nada além disso. Tudo – juro! – sem nenhuma má intenção.
Em pé diante da porta, eu o observava consertá-la com a agilidade de um mister-latin-rei-da-engenharia. Ele contou que esteve no Rio a trabalho algumas vezes, eu me exibi dizendo que conhecia bem o seu país, que já havia cruzado todo o norte da Venezuela parando de cidade em cidade e atravessando a fronteira da Venezuela com a Colômbia até chegar em Cartagena. Eu errava o tempo todo as palavras em espanhol, mas ele acertava no interesse pela história. E fazia tempo que eu não me sentia tão interessante diante do olhar de um homem, sabe? Ainda mais sem mais sem poder contar com as palavras certas…
Cinco minutos depois não havia mais barulho nas engrenagens da fechadura e ele me perguntou se eu gostava de licor. Sorri achando que era cantada, respirei fundo antes de agradecer e dizer não, mas ele fez uma ligação pelo seu rádio ultra-power-latin-rádio-dos-reis-da-engenharia pedindo que me trouxessem um café da manhã como cortesia do hotel e um cálice de licor como presente pessoal de sua parte. Tentei dizer algum não, mas ele foi mais seguro de suas ações e justificou a gentileza dizendo que era o mínimo que podia fazer diante do aborrecimento que estava me causando as nove da manhã.
A campainha tocou de novo no instante seguinte, achei que fosse ele, mas era a camareira. Uma senhora com uma pele luminosa, negra, um sorriso cordial e suave, meio doce, mas com um olhar de quem seria capaz de criar vários vudus de quem não a obedecesse. Avisei que eu não falava inglês, ela só sabia falar inglês e queria porque queria arrumar o quarto. Insisti no “not”, “thank you” e em todo o “the book is on the table” que me foi possível, peguei as toalhas novas que ela havia trazido, ela dizia algo como querer três dólares por cada uma, eu não tava entendendo bulhunfas, a dona já tava começando a transfigurar minha cara de “tô me achando sexy” para a de “tô ficando puta”, até que devolvi as toalhas pra dar fim na conversa, fechei a porta no meu “goodbye” do pré-primário e a ouvi clamar por “God” a distância.
Fechei a porta, tirei o roupão e me joguei nessa cama enorme que me abraça dos pés a cabeça toda vez que me deito sobre ela. Jogada na cama, de bruços, bumbumzão pra cima, deitadona do jeito que vim ao mundo, ouço alguém mexer na maçaneta da porta e abri-la como se eu não existisse, sem tocar campainha nem nada.
Sabe lá meu português o porquê, talvez porque eu ainda estivesse com um sorrisinho besta de feliz na cara, gritei por Deus em inglês. Nada muito histérico, mas vindo de um susto que me fez saltar da cama enquanto via a sombra de um senhor que rapidamente fechava a porta e se desculpava pela invasão.
Coloquei o roupão de banho, abri a porta já pensando em mandar todo mundo a merda no meu português italianado de bom tom e vejo um senhor de uns sessenta anos, negro, alto, alto… Um senhor de traços firmes e expressão honesta. Uma prancheta na mão, também munido de vários apetrechos eletrônicos pendurados em seu cinto de utilidades e me perguntando em espanhol se eu não havia pedido um conserto no meu chuveiro. Olhei aquela situação e mal consegui responder que não havia nada de errado com o chuveiro. Tive uma crise de riso que fez o senhor se desculpar mais uma vez, todo encabulado. Fechei a porta. Dessa vez, com o trinco.
Passei o trinco, ri das três inesperadas visitas e decidi tomar um banho e finalmente sair do quarto, parar de trabalhar e ir passear um pouco. Chuveirada boa tomada, desliguei o chuveiro e comecei a me pentear em frente ao espelho. Parei um instante e, sabe lá Deus o porquê, não estava mais me sentindo tão pra baixo. Me senti bonita, bonita… Como há alguns anos não me sentia. Abri a janela do quarto, sorri pra mim mesma, para o dia quente me chamando pra rua e fiquei com vontade de licor.
Para um homem, deve ser lindo e estimulante ver uma mulher entregar-lhe pizza, prazer e um pouco de silêncio. Mas, olha… Para uma mulher, erotismo pra valer é ela se sentir bonita através de um simples olhar, é ver um moço sorridente consertar a fechadura sem ela ter que implorar, é falar bobagem sem ter medo de errar, é receber café na cama antes de se despedir. É o desejo de nunca deixar de desejar e fazer poesia misturando licor misturado com café, as nove da manhã. É pensar que mesmo quando a gente está muito triste e se recusando a sair do quarto, a vida pode nos enviar curiosos cálices de fé para nos tirar de dentro dele.
Bonito.
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oi,eu sou beatriz estou no setimo ano.Li seu um trecho de seu livro,meninas mas arranjam tempo quando lhes interessa;Gostei muito e por isso quero te parabenisar pelo seu talento.
Café da manhã com licor?
Amarula com sucrilhos nela!
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