Gripada, jogada na cama com aquela cara típica de quem está no leito de morte esperando a vez, decidi sair em busca de uma sopa milagrosa. Levantei, tomei banho e, na tentativa de achar felicidade tanto quanto um antigripal, fui parar em um restaurante nordestino que eu era louca pra conhecer. Cheguei, sentei, pedi o cardápio e perguntei pro garçom…
– O que você recomenda pra quem está nas últimas?
– Cachaça e caldo de mocotó.
– Hum… Se eu for de cachaça vocês vão ter que me deixar dormir na cozinha até segunda-feira. Mas, vamos lá, caldo de mocotó… Nunca tomei. Nem sei o que é mocotó. É bom mesmo?
– Opa! Especialidade da casa! E é um santo milagreiro pra quem tá com gripe, a senhora não vai acreditar na disposição!
– Ok. É tudo o que eu preciso. Manda um grande.
– O grande é grande pra valer, hein dona… Tem certeza? O caldo é milagroso, mas tem que ver se a senhora aguenta o tranco…
– E quem é que não aguentaria uma dose cavalar de saúde? É só sopa. E eu não como direito há séculos… Preciso sarar dessa gripe.
– Mas olha, dona… O negócio é…
– Não precisa se preocupar… Pode trazer.
– Bom, a senhora é quem manda…
Virado o primeiro caneco grande de sopa de mocotó…
– Que delícia isso… Muito bom! Vê mais um, por favor?
– Dooona… Tem certeza?
– Tenho! Já tô até esquecendo da gripe, menino! Que coisa boa de caldo. Deviam vender isso na farmácia!
– Mas… Olha…
– Mais um. Grande!
– Tá bom… A senhora é quem manda.
Virado o segundo caneco grande de sopa…
– Caramba… Tô esquisita.
– Eu tentei avisar a senhora…
– Não… Não tô passando mal não. Só esquisita mesmo. Um calor… Que coisa. Com esse tempo danado de frio, como posso com esse calor?
– Então, dona… Eu tentei avisar, mas a senhora não me ouviu. Mocotó é bom pra gripe, mas também é bom pra outras coisas, né?
– Que coisas!?
– Coisas do tipo da natureza do corpo…
– Como assim!?
– Coisas maiores. Ainda mais a senhora vindo jantar sozinha… Agora lascou… Tem marido em casa?
– Que!? Como assim, meu senhor!?
– Pois é… Mocotó é afrodisíaco, dona. Isso tem um efeito intrasexual quase paranormal!
– Anh!?
– Intrasexual, dona… É o furor que vem de dentro, não acontece através dos zóio nem do tchaca-tchaca na butchaca.
– Anh… E “paranormal” seria porque…
– Ué, porque paranormal é coisa de espírito! E lá na minha terra a gente dizia que quando o caldo entrava, o espírito da boiada baixava.
– …
– A senhora me desculpe a riqueza de detalhe na explicação, mas é melhor a gente adquirir cultura do que sair doida por aí comendo nos lugar sem saber porquê, né? E além de tudo é gulosa! Agora lascou. É por isso essa caloreira toda aí… Afrodisíaco! Dois canecos! Dos grandes!
Eu bem que quis mandar ele plantar batatas, mas a questão do afrodisíaco era importante ser esclarecida…
– Cê tá de brincadeira comigo que essas coisas funcionam de verdade? E agora!? O que eu faço? Quanto tempo isso dura?
– Sem marido em casa?
– Tem marido nenhum não!
– Vixe… Nessa quantidade toda que a senhora tomou… Sem marido vai ser osso duro de roer. Pegar gripe tudo bem, mas pior de tudo é pegar gripe sem pegar ninguém! Ainda mais em pleno sábado a noite e toda bonitona desse jeito… Tsc, tsc, tsc. O que a senhora tem de errado? Deve ser problema de gênio, né? Tem gênio ruim, não tem? Certeza de que é problema de gênio. Devia ter ficado só na cachaçinha, dona… Seria melhor. Foi de mocotó, agora lascou.
Acalorada, segurando meu gênio ruim, achei melhor correr pra casa e tentar dormir. Sozinha. Eu e meu gênio ruim, tentando controlar os efeitos intrasexuais paranormais do espírito daquela maldita boiada dos dois canecos. Grandes!