– Por que você viaja tanto?
– Pra imaginar quem eu seria se tivesse nascido em outro lugar.
– E quem você seria se tivesse nascido aqui?
– Provavelmente, a menina sorridente que vive dentro desses seus olhos…
– Ela é uma menina bonita…
– Hum… Adoro esse lugar, essa cachoeira…
– Gosto que você goste.
– Podiam plantar mais girassóis por ali…
– Você bem que podia ser a menina sorridente dos meus olhos com mais frequência, não acha?
– … E o que eu faço com meu medo?
– Do que você tem medo?
– De cair… De você finalmente perceber que vivo distante e tentando me agarrar ao meu pouco tempo.
– Você não vai cair.
– Como pode ter tantas certezas?
– Não são tantas, só uma.
– Eu também tenho uma.
– A sua é a do fim, a de que tudo vai sempre acabar e dar errado. Não vale.
– E a sua qual é?
– A do começo.
– Que começo?
– O começo do nosso começo, Alê… Quer casar comigo lá na catedral?
– 🙂 Agora?
– Agora não dá porque você mora longe. Mas se você quiser de verdade ser a menina que mora nos meus olhos, podemos casar assim que o seu coração couber numa mochila e você conseguir arrastá-lo pra cá.
– Meu coração não vive mais tão longe… Só meu corpo.
– Você escolheu nascer lá, esqueceu?
– Será que a gente escolhe isso? Será que alguém escolhe nascer duas quadras de terra depois da porteira que dá pra essa cachoeira ao invés de nascer a duas quadras da praia de Copacabana?
– Quando eu era pequeno dizia que tinha nascido lá na catedral…
– Ela é linda… Acho que foi a única igreja que conheci que me deixou com vontade de casar.
– Ela é a certeza do meu começo. Agora faz sentido ter escolhido nascer no único lugar que te faz pensar em casamento.
– Você ficará bem quando eu for embora?
– Conhece alguém que ficou bem depois de separar da pessoa que amava?
– Se eu for antes de você, jura pra mim que vai se esforçar pra tristeza não ser muito longa?
– Li uma frase uma vez que dizia que só sabemos o que realmente sentimos por uma pessoa quando conseguimos imaginar o que seria de nós se ela morresse. Quando li isso, pensei no que seria de mim se meus pais morressem, meus irmãos, meu melhor amigo e você.
– E?
– E espero morrer antes de você…
– Você sabe que não será assim, sabe que meus dias serão menores que os seus.
– …
– Além do mais, pessoas mais velhas morrem primeiro… 🙂
– Eu te amo… Como é que eu posso pensar em continuar sem você por perto?
– Vamos combinar uma coisa? Quando acontecer, você chora tudo o que sentir de chorar. Quando não houver mais lágrimas você vai me prometer vir até aqui, descer todas essas pedras, fechar os olhos, deixar a água cair sobre o seu corpo, lembrar de hoje e de todos os dias que ficamos esparramados olhando para este céu e voltar lá para cima para seguir em frente com a sua vida. Em frente e bem! Vai deixar qualquer tristeza aqui embaixo e subir para voltar a sorrir. Eu prometo que se houver qualquer tipo de consciência depois da morte… Se ela não for uma brincadeira de mau gosto com começo, meio e fim injustificáveis, dou um jeito de te deixar um beijo.
– Jura?
– Juro se jurar ficar bem.
– Juro.
– Hum… Na catedral?
– No dia que você quiser, no tempo que for permitido.
– Eu quero…
– Eu quero que seja para sempre.
Nossa…
Tocou, profundamente…
Sério mesmo
puxa. Me emocionei. De verdade.
Excelente. Quando tinha vinte e tal fazia com que prometessem que teria um funeral com velório e carpideiras, uma loura escandalosa que diria ser amante do meu companheiro, muita cachaça. Hoje já decidi que quero ser cremada, minhas cinzas postas em uma pedra embaixo da palmeira daqui de casa com uma plaquinha de bronze gravada nela a “Canção do Exílio.” Como a mulher do teu post mais atual, no Caju não quero ir por nada. É feio demais. Prefiro ser cinza.
Já comentei antes, faz tempo, que você tem um dom especial para o diálogo. Parabéns.
bárbaro!!!
este post,é uma das tuas superações!!!
bjo
que coisa linda…
Adorei o texto, Alê.
Um beijo. Sem língua.