Din don… Din don…
– Que horas são? Quem é o louco que está tocando a campainha uma hora dessas?
– Xiiii… Não bota a cara na janela que ela vai te ver! É a Marta… Aquela mulher que eu conheci ontem no parque… A hostess do Araçá.
– A janela está fechada, não tem como ela me ver.
– Dá pra ver pelas frestas. Sai daí antes que ela veja seu vulto.
– Vocês não combinaram de andar no cemitério do Araçá agora de manhã? Não acredito que você vai furar com a mulher logo no primeiro dia.
– Ela está acostumada a andar sozinha. Não precisa de mim…
Din don… Din don… Din don…
– Parece que ela vai insistir.
– Não tô acreditando…
Din don…
– É louca essa senhora? Não vê que eu tô dormindo?
– Você pediu pra ela te acordar, oras!
– E você parece que está do lado dela!
Din don… Din don…
– Se ela tocar mais uma vez eu vou abrir essa janela e mandar ela tomar…
Din don…
– Tomar?
Pulei da cama e abri a janela. Olhei pra baixo e…
– Quem ééé???
Como se eu não soubesse… Lá estava dona Marta, a recepcionista do cemitério do Araçá, com um tênis rosa choque, moletom azul adidas com listras brancas, sorriso de bom dia, óculos escuros daqueles grandalhões que deixam a gente com cara de mosquito e… E um espinafrado cabelo cor de abóbora!
– Só um minutinho… Só um minutinho, por favor.
Eu juro que teria mandado as favas minha educação se não fosse hilário imaginá-la com aquele cabelo, atendendo a parentada dos mortos do cemitério. Acabei sorrindo, fechando a janela discretamente e…
– Tomar aonde mesmo? Quanta gentileza, dona Alessandra…
– Quem se veste desse jeito? Você viu aquele cabelo? Por que você não me disse que ela estava vestida de Bozo? Eu teria atendido a campainha muito mais rápido.
– Ela te convidou pra fazer ginástica dentro de um cemitério! O que você esperava? Que ela fosse normal?
– Vamos caminhar. Nada de ginástica. E ela trabalha no cemitério, o que significa que não deve ser um caso de loucura, mas sim de praticidade. Que figura essa sujeita… Muito engraçada.
– Eu não falo mais nada… Agora me da um beijo de tchau e apaga a luz que eu vou tentar dormir e acordar com um dia menos bizarro.
– Tchau, tchau, tchau…
– Boa caminhada.
– Boa manhã de sono.
Desci as escadas correndo, abri o portão e…
– Oi! Desculpa a demora. Parece ridículo, mas esqueci completamente que combinamos de começar as caminhadas hoje.
– Combinamos ontem e você já esqueceu!?
– Pois é… Muito trabalho.
– Desculpa velha. Precisa ser mais criativa ou parar de inventar histórias.
– Anh?
Apesar da indignação com a grosseria, dei risada. Pessoas francas e folgadas sempre me fizeram rir.
– E eu não sei que você gosta de pessoas assim? Você teve um ataque de riso quando foi apresentada ao pai de um namorado e ele te chamou de Orca! Deve ter sido uma cena realmente incrível… Eu diria que deve ter sido seu momento mais espirituoso. Você já parou pra pensar que se, naquele dia, sua reação tivesse sido de ofensa ou qualquer outra que não fosse achar graça, sua vida teria tomado um caminho completamente diferente?
– Quê?? O que é que você está dizendo? Como sabe que…
– Sim! As pessoas não se dão conta de que são as reações que determinam suas relações. É fantástico como uma simples expressão pode mudar toda a trajetória de uma vida! Você já pensou…
– Só um minuto! Como é que você sabe dessa história?
– É… Lembra? O pai dele estava bêbado, seu namorado ficou morrendo de vergonha, achou que vocês terminariam antes mesmo de começar e mesmo assim você…
– Quem diabos é você? O que é que você está falando? Como é que você pode saber de algo que aconteceu há tantos anos? Eu não te conheço! Nos falamos ontem por acaso, mal conversamos e…
– Well, well, well… Não precisa morrer de medo. E tire essa expressão de pavor do rosto. Não combina com o seu cabelo.
– Olha aqui, eu não sei quem você é, mas eu vou…
– Vai o quê? Vai voltar correndo pra casa e passar o resto do ano olhando pela fresta da janela tentando compreender o que está acontecendo aqui fora? Ou vai tomar coragem pra subir essa ladeira comigo e seguir com a sua caminhada?
Por um segundo pensei em virar as costas, abrir meu portão e voltar correndo pra cama. Cheguei a erguer as sombrancelhas e botar as mãos na cintura em tom desafiador, mas a verdade é que eu só pensava que, nem morta, eu iria com aquele fantasma caminhar dentro de um cemitério.
– Eu não sou um fantasma. E andar fará você perder o medo. Além do peso, é claro!
Não é possível que essa vaca seja capaz de ler o meu pensamento…
– Que mania você tem de ofender as pessoas aí dentro dessa cachola, hein!
Mas que vaca maldita! Como é que ela faz isso?
– Well, well, well… Vamos. Eu conto no caminho. Mas, por favor, pare de me chamar de animal sagrado.
Senti a entrevista franzir mais do que o normal, medi a Bozolina dos pés a cabeça e antes que eu conseguisse dizer qualquer coisa ou sair correndo …
– Tudo bem, tudo bem… Pode me chamar de vaca. Eu sei que exagerei na tintura, mas daí pra você me transformar na versão feminina daquele palhaço bocó é um pouco demais pra mim.
Santo Deus, ela lê mesmo os meus pensamentos! Não, não pode ser. Ela deve me conhecer de algum lugar, está de sacanagem… E se ela for paranormal? E se está com esse papinho de mãe Dina só pra me levar até o cemitério e roubar todo o meu dinheiro? Mas que porra é essa de “todo meu dinheiro”, criatura!? Quem você acha que é o, dona magnata?
– Ai, ai… O bom é que tem dias que a gente não precisa falar nada.
Acho que isso foi pra mim de novo… Merda. Como ela faz isso? Toma vergonha, Alessandra! Isso é truque.
– Acho tão engraçado quando as pessoas falam com elas mesmas e ainda se chamam pelo nome como se houvessem entidades dentro delas…
– Só vou com uma condição.
– Mas você é mesmo muito esquisita… Mesmo quando está se borrando de medo é arrogante. É arrogante mesmo diante da sua gigantesca ignorância.
– Vai ter que me ensinar como você faz isso ou eu não arredo o pé daqui.
– OK. Tchau.
– Ei, espera aí. Também não é assim!
Maldita curiosidade! Se ela for embora, não vou descobrir nunca.
– Eu tô brincando, Marta… Quer dizer, não estou. Eu quero mesmo saber quem é a pessoa que nós temos em comum e que contou pra você essas coisas sobre mim.
– O que você acha que eu estou fazendo? Escondendo um coelho dentro de uma cartola? Não é assim que funciona. Vamos embora e, pelo amor de Deus, não viaja nas suas teorias furadas.
Com a espalhafatosidade que lhe era peculiar, Marta ajoelhou na calçada, amarrou o cadarço do tênis, levantou, esticou-se como quem se alonga para uma maratona e saiu caminhando e resmungado…
– A curiosidade é a única coisa que pode ser maior do que o medo do ser humano… Deus me livre! Que seja… Pelo menos no seu caso, ainda bem.
Eu? Eu fui atrás… Rumo ao cemitério do Araçá, ao lado daquela doida. Truque, sacanagem ou paranormalidade, eu é que não deixaria a Bozolina ir embora sem dizer a que veio.
– Vamos começar direito. Bom dia pra você.
– Bom dia pra você também, dona Marta.
– Assim está melhor… Qual das duas ladeiras você prefere? Na-na-na… Não precisa responder. Não é necessário ser vidente pra ver que você prefere os atalhos. Andam chamando isso que você tem de síndrome da pressa, sabia? Mas enfim, ladeiras cansam. A gente conversa quando chegar no Araça.
Não dava nem pra argumentar. Enquanto ela falava, já estávamos no meio da ladeira e meu coração já estava na boca bloqueando a passagem de qualquer palavra que eu quisesse emitir. Aquele era definitivamente o melhor jeito de me fazer ficar quieta…
Continua——————–>>>
Clique aqui para ler o Post I – A Hostess do Araça.
Muito boa a história. Vê se termina.
kkkkk…vejo que vc continua criativa nas suas desculpas,lembra da mosca que entrou no seu olho ??????nunca me esqueci de tamanha cara de pau…beijos na alma …lindona!!!!! to morrendo de rir ainda…
Caraca, Ale! E eu que achava que depois da saga do primeiro beijo vc nao escreveria nada melhor. adorei!!!!!
Pode dizer o que quiser dona Alê, essa história aí é páia!! huhahauhaua
Aleee, essa historia esta a melhor! Eu leio seu blog desde a época que ela era no blogger e já li seu blog inteirinho. Acho um encanto o jeito que vc escreve, sou fanzona! Baba-ovo, como vc dizia no começo do blog. hehe
Ótima!
hahhahaha
Ale, essa vidente cobra quanto a caminhada??
hahhaha
A Juliana tem razão, vai fazer fila no cemitério do Araça se a vidente for das boas. Parabéns, Ale. O tempo passa, o tempo voa e vc não perde esse seu jeito de deixar a gente grudado no blog.
O legal dos seus posts é que, além deles serem gostosos de ler, a gente fica se perguntando se há algo de verídico neles ou se são pura ficção.
Bah! Odiei. Hehehe Mentirinha, era só pra fazer um comentário diferente.
As vezes eu perco o foco lendo seus posts.
nem li ainda, mas wolvs!
aleluia!
Muito bom!!!
bjs
Puxa primeira vez que entro em um blog e passo tanto tempo lendo. Revirei seus arquivos procurando as historias que vc conta. Muito bom!!! Parabens.
Completamente surreal!
Sério, pq vc não escreve um livro??
Oi…nossa nunca entrei aki…e adorei de priemira fikei mto curiosa com essa historia…pena ki li a ultima parte em vez da primeira…mesmo assim me encaixei e li td…e estou mto interessada na continuaçao…ki tal continuar???naum pera…sempre voltarei pra ler…bjaum!!!e xau xau
Como a Gabi disse: “a gente fica se perguntando se há algo de verídico neles ou se são pura ficção.”
Também vale a pena visitar o Paredão.
http://paredao.blogger.com.br/index.html
Está ótimo!
É isso aí, como sempre, a maior força para ti!
.
Gostei, super criativo..
Isso é conto adaptado de um acontecimento da sua vida ou pura criatividade?
Ai se eu encontro alguém assim… Minha cabeça é um poço de besteiras! hahaha
E o beijo, hein??
Beijos =*
Que texto ótimo! Já tinha gostado da parte I, até mandei o link pra uns amigos…!
Também sou sua fã, menina, vc é muito boa.
E por falar nisso, onde eu posso comprar o Balde de Gelo??
beijos
Estou super empolgada com essa história.., muito boa…
Parabéns!!
huhauhauha,só querver a continuação huahahaha..
Sempre criativa neh ale 😛
da uma olhadinha no meu blog!
http://cocaainageladeira.blogspot.com/
Poxa ale.. seu blog eh tão legal.. acompanho ele desde q comecei a ler a Saga do Primeiro Beijo, mas pelo jeito n tem +!
Oh vida cruel
Axo q agora eu vou pro bar xorar minhas mágoas..
‘garçom.. aki nesta mesa de bar’
huahuahua
Beijos
Alê!!! Demais..adorei…to super curiosa para ler o resto…
Mas acho q a Dona Marta já esta desencarnada e quer mostrar para a arrogante da Alessandra que ela tbem está.Muito interessante..Parabens…
Bj
Opa quero ver a continuação, ta bem interessante
beijos