Eu achava que motel era só um hotel pequeno; culpa do meu pai, claro! E, se não fossem as boas influências da pré-adolescência, eu teria acreditado
na versão dele por muitos e muitos anos…
Quando eu perguntei a diferença entre um e outro, ele, como um bom pai de uma filha de sete anos, me contou que motel era a mesma coisa que um hotel,
só que sem área de lazer. Disse que os hotéis eram construídos para hospedar famílias e que os motéis não tinham nem parquinho e nem mesa de
ping-pong…
– Nem parquinho, nem ping-pong? Que burros! Vão falir, pai!
– Quem te ensinou o que é falir?
– O seu Joaquim da banca de figurinha…
– Por que ele disse isso?
– Porque eu sempre compro os envelopes com as figurinhas premiadas.
– Compra com que dinheiro?
– Com o dinheiro do meu cofrinho, com o que o vô dá e com o dinheiro dos bolinhos de chuva.
– Que bolinhos de chuva?
– Ai, pai… você não presta atenção em nada, mesmo. Os bolinhos de chuva que a vó me ensinou a fazer e que eu não deixo ninguém comer.
– E o que você faz com aqueles bolinhos?
– Vendo tudo, oras!
– Pra quem?
– Um monte de gente…
– Que monte?
– Ah! Pra todo mundo da escola nova que abriu na rua de cima.
– O que? Como assim, menina?
– Pai, você é tão desligado… Na hora do recreio, pai! A escola ainda não tem cantina e aí eu pensei que muitas crianças devem esquecer a lancheira
em casa… Eu coloco os bolinhos em uma travessa, vou até o portão de grade da parte debaixo da escola e todo mundo compra os bolinhos porque estão
todos com fome.
– Compraram os seus bolinhos?
– Claro! Quentinho, gostosinho, docinho… E os moleques lá da rua me ajudaram.
– Que moleques?
– O Tito e o Rafa…
– É mesmo? E eles ajudaram fazendo o quê?
– Eu disse que daria dez dadinhos pra eles se eles pulassem o portão e avisassem os alunos que os bolinhos de sol e chuva estavam sendo vendidos no
portão de grade…
– Bolinho de sol e chuva? O nome não é bolinho de chuva?
– É, mas o meu é de sol e chuva. Assim as pessoas compram independente do tempo. Entendeu?
– Hum… sei. E os meninos aceitaram ajudar só por dez balas?
– Claro! Não são balas, são dadinhos! E por dez dadinhos até eu teria ido. Além do mais, eles só precisam gritar.
– Gritar? Como assim?
– Ué, gritar… propaganda, pai… “Olha o bolinho de sol e chuva! Olha o bolinho de sol e chuva! Baratinho, quentinho e gostosinho!”
– Eu não acredito… E vendeu bem?
– Tudo! Não sobrou nenhunzinho.
– Nenhum, nenhum?
– Nadinha!
– E a senhorita gastou todo o dinheiro que ganhou?
– Gastei não, investi. Comprei os dez dadinhos que prometi e o resto foi nas figurinhas.
– Dadinhos e figurinhas… E onde está o investimento?
– Nas figurinhas, pai! Onde mais?
– O que tem as figurinhas?
– Ué, vieram premiadas. Já ganhei um monte de prêmios.
– Prêmios?
– É, pai! Ganhei um liquidificador, uma boneca, uma bola dente de leite e uma caixa com dominó e baralho. Por isso que eu sei o que é falir… O seu
Joaquim disse que se eu continuar comprando figurinhas na banca dele, com a sorte que eu tenho, ele vai falir.
– Mas se ele está vendendo as figurinhas, não há motivos pra ele falir. O dono da revista é que deveria estar preocupado.
– Não, pai… não é isso. É que toda a molecada na rua acha que eu sou a maior sortuda. E como eles sabem que eu só compro na banca do seu Joaquim,
eles deixam de comprar lá e vão comprar na outra banca. Eles acham que comprando em outra banca terão mais sorte. Entendeu agora?
– Deixa eu ver se entendi… Só você compra do seu Joaquim, tem a sorte de pegar as figurinhas premiadas e ele perde na quantidade de figurinhas
vendidas?
– Isso, pai!
– Mas era só ele dizer que a banca dele é a banca da sorte! Que não é você que tem sorte, a banca dele é que dá sorte.
– Não, pai. Isso seria mentira. Todo mundo da rua sabe que quem tem sorte sou eu, não a banca.
– E quem te disse que você é melhor que as outras crianças?
– Pai, sorte, ou a gente acredita que tem, ou não vai ter nunca.
– Menina, onde você está aprendendo essas coisas?
– Foi a dona Margarida que disse…
– Dona Margarida mulher do seu Joaquim?
– É…
– E desde quando você conversa sobre essas coisas com a dona Margarida?
– Desde quando ela começou a comprar os prêmios repetidos que eu ganho.
– Dona Margarida faz isso?
– Faz…
– Por quê?
– Porque ela diz que é bom gastar o dinheiro do marido… Principalmente quando ele sai para beber com os amigos e chega tarde em casa.
– Essa é boa… Além de espantar a freguesia, você ainda vende os prêmios pra mulher do homem.
– Mas ela só compra quando eles brigam…
– Eles vivem brigados! Você vai falir o velho!
– Ufa! Achei que não ia entender nunca…
E foi assim que eu cheguei na adolescência sabendo tudo sobre as leis do comércio, um pouco sobre temperamento feminino e nada sobre motéis.



Postado por:Alê Félix
16/05/2004
0 Comentários
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Sophie

maio 16th, 2004 às 22:01

Que texto divertidamente delicioso!!!


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Túlio

maio 16th, 2004 às 22:13

Seu texto ficou bem engraçado, Alê. Foi bem agradável de lê-lo. Altas historinhas da infância, hein… imaginei a cena de uma menininha conversando
com seu pai, rs… mas, não sei pq, imaginei ele dirigindo e a menininha no banco de trás do carro tagalerando, ehehehee!
Espertinha vc, hein, aprendendo desde criança a ganhar seu próprio dinheirinho…
Achei demais esse negócio de vc vender seus prêmios repetidos pra mulher que, com raiva, comprava de vc, fazendo o marido falir ainda mais rápido,
rs…
PS.: Ao invés de vc escrever coloco, vc escreveu colo… certo?!?
Beijos, Alê.


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Tiago

maio 16th, 2004 às 23:33

Meu q texto de mais……. meu foi muito bom… ainda escreverei como vc…..e mas tem q ter historias otimas de crianca pra escrever né…. beijos
tiago!!!


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Tiago

maio 16th, 2004 às 23:44

Meu q texto de mais……. meu foi muito bom… ainda escreverei como vc…..e mas tem q ter historias otimas de crianca pra escrever né…. beijos
tiago!!!


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Lila Andrade

maio 16th, 2004 às 23:49

HUAUHAUHAUHuhuahuahUAAUHAUHAUH
EXCELENTE!!!!
(to sem fôlego de tanto que ri…)


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Francezinha

maio 17th, 2004 às 0:56

Hahahha Sério que vc era uma menina tão esperta assim? Bom, ao menos vc aprendeu sobre comércio, e só aprendeu sobre motel na época certa (existe
epoca creta para aprender sobre qualquer coisa?). Enfim… bisous!


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guilherme

maio 17th, 2004 às 1:38

HAHAHAHAHAHAHA esse foi o melhor até agora. e olha q eu leio isso aqui faz tempo.
isso é mesmo sério? vc era tao esperta assim ou é só mais um personagem? 🙂


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Andder

maio 17th, 2004 às 1:48

Que diálogo bacana, adorei.
Isso realmente aconteceu?
Muito bom.
Meu pai dizia que a diferença é que Motel fica na beira da estrada, mas ele nunca parava quando pedia pra ele me levar pro Motel C. Q. Sabe (motel
local).


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Anônimo

maio 17th, 2004 às 3:24

Q loucura isso, porem com nexo……..


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Anônimo

maio 17th, 2004 às 3:27

Q loucura isso, porem com nexo……..


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Isa

maio 17th, 2004 às 3:41

Isso me lembra a primeira vez que passou uma propaganda de camisinha na tv. Eu nunca tinha visto aquilo, devia ter uns 12 anos, e perguntei pro meu
pai se uma camisinha era uma camiseta pequenininha e meu pai (detalhe: médico) emendou na hora: isso mesmo filha, é isso mesmo! Pobres crianças…


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Prih

maio 17th, 2004 às 8:31

Huhauhau XD
Massa esse blog, vc escreve mto bem!! =D
;****


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DeH

maio 17th, 2004 às 9:26

hahaha,, típico 😉
:*** mossa!


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Neto Cury

maio 17th, 2004 às 12:45

Delicioso este post! Exatamente como bolinho de (sol e) chuva!
Beijos


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André Stern

maio 17th, 2004 às 13:56

E viva a prolixidade XD
hahaha… das duas uma: ou você teve uma superinfância ou é só a hiper criatividade mesmo… to apostando na segunda opção 😉
Ótimo post, ídola XD


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bella

maio 17th, 2004 às 16:33

Hahahaha … Adorei!…. ;o) …
Ótimo texto!


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Duh

maio 17th, 2004 às 17:45

Putz!!! Muito engraçado… esperta desde cedo, hã?? rs.. 😉
Beijãooo


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juliana

maio 17th, 2004 às 19:16

Gostei muito dessa história, mas gostaria que postasse sobre a saga do 1º beijo, que é incrivelmente boa e há muito tempo não posta nada, ainda mais
agora na parte final! Obrigada


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Fabricio

maio 17th, 2004 às 22:19

Olha, bem, veja… nossa, é que, assim, tipo, olha só…. eu queria dizer que, enfim….
SEM PALAVRAS SOBRE O SEU TEXTO.
=)
See Ya


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Mi

maio 18th, 2004 às 2:42

CARAMBA!
Nao consigo me expressar.
Vc eh tudo nessa vida, simplesmente A-M-E-I!


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Edson Pinheiro

maio 18th, 2004 às 10:14

Olá! Gostaria de Fazer parte do Orkut! Aí vão meus dados:
Nome: Edson
Sobrenome: Pinheiro
E-mail: edson.jr@terra.com.br


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Taly

maio 18th, 2004 às 11:03

hauhauhauhauhauhau
Boa!!
E com 7 anos vc já se virava que máximo!!
Beijos


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luciano

maio 18th, 2004 às 15:19

muito, muito show gostei mesmo, e se puder vou copiar para mandar para meus amigos, o texto é muito criativo e merece até um premio.
foi vc mesmo que o criou, ou vc adaptou algum texto?? se foi vc parabens


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Carol_Gua

maio 18th, 2004 às 16:12

Caramba, seu pai perguntava demais, heim…rsrs…


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Pucca

maio 18th, 2004 às 16:16

Fala serio ?! 7 anos ?!?!
Ale, vc ja nasceu assim neh … Eh muita esperteza e atrevimento… Que figura vc !!!!
Otima essa de falencia.. coitado do homem…
bjs


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Flibusteiro

maio 18th, 2004 às 17:12

Querida Alê,
é muito agradável o seu texto, talvez porque sua infância tenha sido bem agradável também.


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ufgh

maio 18th, 2004 às 20:09

amei o seu texto!


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Trinity

maio 18th, 2004 às 20:29

Hahaha, se não te conhecesse diria que você não existe… muito boa =)


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Dead Fish

maio 19th, 2004 às 0:23

Esse foi seu melhor texto dos ultimos tempos! parabéns!


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Diego Domingos

maio 19th, 2004 às 1:22

Internet é uma coisa engraçada, não é, Alessandra? Uma coisa leva a outra. Não é como ler um livro; é você ir no museu para ver o quadro. Ler Gabriel
Garcia Marquez, “Viver para contar” é você se enfurnar no mundo dele, sentir todos os cheiros e texturas na narração. Net é diferente; é mais
parecida com a tv. Estava eu no site do Observatório da Imprensa lendo um artigo sobre o presente e o futuro do jornalismo e lá citavam (Alexandre
Cruz Almeida) seu nome num caso de abuso de poder da dona do nome Amarula com você e seu blog. E como um link puxa outro cá estou a comentar a bela
surpresa de te conhecer, “literalmente”. Estou um pouco enferrujado com as palavras, usando muitas para dizer muito pouco – porque sou um ex-poeta
recém-casado e recém-papai, do Pablo, que nasceu há 15 dias – mas não poderia continuar navegando sem antes deixar aqui minha gratidão pela surpresa
de encontrar aqui o seu talento e alento pra mim também, amante das Artes e Letras. Abraços.
Diego


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bird

maio 19th, 2004 às 13:10

caramba! mto show esse seu blog! acabo d elikar vc… bjs e parabens! =)


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bird

maio 19th, 2004 às 13:15

caramba! mto show esse seu blog! acabo d elikar vc… bjs e parabens! =)


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Evilbrake

maio 19th, 2004 às 13:27

Que texto é esse? Parabéns!!!
Desde cedo experrta, moça!
Kisses,
Evil


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Ju

maio 19th, 2004 às 19:26

Adorei!!!! hehehehe
Alê, vc recebeu meu e-mail, moça?? :o)


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Kekinha

maio 20th, 2004 às 17:16

Hahahaha, Alê, você era uma figura (premiada, rs). Adorei toda essa explicação, que garota esperta! 😀
Beijos


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Déinha

maio 20th, 2004 às 18:44

Complexo isso, hein?
Adorei o texto!


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Vini, Vidi, Vincit

maio 26th, 2004 às 17:27

Menina, como vc cresceu! Eu era teu leitor no tempo do inspira e do spamzine, lembra? Posé. Estou te lançando como a grande revelação feminina da
internet, e acho que eu não sou o primeiro. Tu e o Inagaki são o diabo! Parabéns mesmo.


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