– Tem gasolina no carro?
– Tem.
– Isto parece falta de gasolina…
– Acho que tem.
– Acha ou tem?
– Eu abasteci antes de ontem…
– Mas o combustível está na reserva! Quanto você colocou?
– Dez reais.
– Você tem idéia de quantos quilômetros nós andamos com este carro desde antes de ontem?
– Eu sei lá! Você que está dirigindo, você que deveria saber.
– Eu estou dirigindo há um minuto, não há dois dias. Dez reais não dá pra nada!
– No dia deu.
– Ótimo! Agora, graças à sua pão-durice, estamos sem gasolina.
– Ah! Agora a culpa é minha?
– Eu não entendo porque você não enche o tanque. Não é a primeira vez e não será a última que esquecemos de conferir o ponteiro do combustível. Nós
somos assim, você sabe disso.
– Ok. Então, vamos fazer o de sempre: chamamos um táxi e resolvemos tudo em dez minutos.
– Dez reais, dez minutos…
– Também não sei porque esses caras que fazem carros, não fazem um painel que apita quando o combustível está na reserva.
– Alessandra este carro saiu da fábrica dez anos depois de você. Naquela época nem o alerta da luz de reserva eles colocavam. E se alguma coisa
apitasse neste carro enquanto a gente dirige, era bem capaz de haver um acidente por apitada.
– Tá me chamando de velha?
– Ahn?
– Você disse que o carro é velho por isto não tem nem luz de reserva. Sendo assim, eu que tenho dez anos a mais que o carro, tenho vários defeitos de
fábrica e sou uma velha.
– Não. Só disse que você nasceu em 73 e o carro em 83… Você não pode estar falando sério.
– Não. – dei um sorriso de Coringa. Estava de gozação. – Mas que podia ter um barulhinho leve, isso podia. Igual ao som que acusava fim de
combustível no aviãozinho do River Raid.
– River o quê?
– Atari. Era um cartucho do Atari. Dun, dun, dun…
O carro parou de vez.
– Chamo o táxi?
– Não. Tem um posto na Heitor, vou a pé. Você vem comigo?
– Ah, não! Me cansa só de olhar pra esta ladeira. Ainda estou com moleza de comida baiana… espero aqui.
– Talvez já esteja na hora de trocá-la por uma de vinte.
– Rá, rá, rá. Sem graça…
– Nada mal, hein? Uma dez anos mais nova, que não se importe de gastar mais de dez reais para encher o tanque e que não tenha preguiça de perder dez
minutos em uma caminhada de dez metros.
– Dez metros sem moqueca, com moqueca eles se tornaram dez quilometros. Tchau!
Continua