31 de Março de 1991
Foi minha primeira grande aquisição com dinheiro próprio: um flash Metz C-41, alemão, com não sei o quê de ouro e o escambau. Não perdia uma foto com
ele. Também, por aquele preço! Paguei uma fortuna em suaves prestações. Para pagá-lo, precisei vender meu outro flash; um Mirage meia boca que só me
dava dor de cabeça.
Vendi pra um garoto do bairro que estava louco por ele, mas me deu um balão na hora de pagar. Fiquei tão nervosa que fui atrás do garoto; ou ele me
pagava ou me devolvia o flash.
Fui atrás mais ou menos… Quando descobri que ele morava em uma favela super boca-quente e que tinha vendido meu flash pra outra pessoa, enchi a
paciência do meu namorado pra ir comigo. Na época, eu tinha um namorado gracinha de tudo, desses que mata e morre pela namorada. Ele era todo
desesperado, mas vivia me protegendo. Eu tanto falei e tanto insisti que ele foi comigo procurar o menino.
Não o encontramos. Demos com a cara na porta depois de ter atravessado uma favela barra pesadíssima. Saímos de lá rezando para chegar em casa. Quando
chegamos, ele me fez jurar que eu não voltaria naquele lugar sozinha. Eu jurei e deixei-o ir embora, porque já era tarde e ele morava do outro lado
da cidade.
No dia seguinte acordei entediada. Café na mesa, minha mãe não estava, os pivetinhos dos meus irmãos estavam na escola e a chata da minha irmã tinha
acabado de conquistar o direito de usar o aparelho de som só pra ela. Teria sido um dia sofrível, se não fosse primeiro de abril.
– Ô, preciso falar com você.
Silêncio. Eu e minha irmã nos odiávamos.
– Fala comigo, menina!
– O que você quer?
– Ficar de bem. O que você acha da gente fazer as pazes pra sempre? É sério. Prometo que não te azucrino mais e você promete não fofocar sobre a
minha vida nem para o papai, nem para a mamãe. O que você acha?
– Eu não sou fofoqueira!
Silêncio…
– Tô falando pra valer. Quero ser sua amiga.
– Para de mentir menina!
– Depois não diz que eu não tentei. Estou oferecendo minha amizade.
– Fala logo o que é você quer! Aposto que está metida em alguma encrenca e precisa da minha ajuda.
– Tá bom. Não acredita em mim, problema seu.
Silêncio…
– Tá bom, tá bom, mas se você pisar na bola comigo eu juro que…
– PRIMEIRO DE ABRILLLLLL!!!!
– OTÁRIA! %^&$#@
Arremesso de talheres…
Passada a raiva, saí do banheiro (eu me trancava no banheiro para provocá-la sem sofrer agressões físicas) e fui falar com ela.
– Trégua, trégua, trégua…
– Sai daqui! Não quero falar com você. Desinfeta do meu quarto antes que eu te dê uma sapatada na cabeça!
– Calma, ô! Descontrolada-passa-mal.
Silêncio…
– Tenho uma proposta de paz.
– Não fala comigo!
– E se a gente pegasse o Cadu no primeiro de abril?
– Não conta comigo.
– Vai, deixa de ser chata! Já tenho tudo em mente.
– N-Ã-O!
– Você liga na casa dele, diz que eu voltei na favela hoje de manhã pra recuperar o meu flash, diz que rolou um tiroteio e que você não sabe direito
o que aconteceu, mas que eu fui levada de ambulância para o hospital.
Silêncio…
– Beleza! Fala ai o telefone dele.
A história continua nos posts aí em cima…



Postado por:Alê Félix
01/04/2003
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