Sem atenção, o barato realmente pode sair caro.
Sempre que eu faço uma merda, como se não bastasse, acabo falando uma merda ainda maior. Já que eu tinha dado um
leve “chega pra lá” no cão, por que não admiti o acidente e pronto? Não, eu precisava fechar com chave de ouro! E as
palavras saíram facilmente através da minha boca grande:
– Xi! Caiu! O cachorro caiu!
Desde quando um cachorro que está no chão de uma sala pode cair? Aquela foi a coisa mais estúpida que eu podia ter
dito e eu disse!
O cretino do cachorro pulou para o colo da sua dona no instante seguinte ao pontapé. Eu, com a minha cara tonta de
pau, ainda fiquei perguntando se o bicho tinha se machucado do tombo que eu inventei.
Dona massagista, por sua vez, ignorava a minha pergunta e até a minha própria existência. Ela estava atrás de mim na
hora do “pé teléco” que eu dei no poodle e, provavelmente, não viu direito o que aconteceu. Tomou as dores da
cria e tratou de adulá-la.
Que coisa horrível de ver! O cão lambia a face daquela senhora, lambia-lhe o cabelo, a orelha, a boca, tudo regado a
lipossomas, ácido esteárico e aloe vera. E a louca, chamando-o de “minha filhinha”, “meu nenê” e coisas do gênero.
Eu precisava sair dali. Desci da maca, me vesti em tempo recorde, assinei o cheque e me despedi com aperto de mão e
sorrisos. Sai de lá correndo, quase que dos poodles. Entrei no elevador, fechei a porta ainda ouvindo o choro dos
nenês da mulher do pires e tive vários ataques de nojo. Como foi bom ficar sozinha no elevador… pulei, fiz todas
as caras de nojenta que evitei durante a massagem e soltei em voz alta todos os “écas” que estavam acumulados
no meu peito. Passei pela portaria do prédio, dei boa noite para o porteiro (que se contorcia de rir sabe-se lá deus
porquê), peguei meu carro e respirei aliviada mesmo sem conseguir tirar da lembrança a imagem daquela língua canina
coberta com creme hidratante.
Cheguei em casa com cara de quem tinha uma barata andando pelo corpo. Entrei tirando a roupa e espalhando-a pelo
chão de casa. Precisava de um chuveiro urgente! Maridon sem entender nada. Tomei meu banho com bucha vegetal, me
embrulhei em toalhas felpudas, repousei a cabeça na poltrona e só então caiu a ficha nesse meu cérebro de ostra
mole.
Na pressa e diante de tudo que tinha acontecido naquela noite, eu havia assinado um cheque de duzentos reais para a
dona massagista! Vários “putas que os pariram” mais tarde, meu marido:
– Mas não eram vinte reais que você pagaria pela massagem?
– Sim, isso mesmo! Só que essas coisas são compradas em pacotes. Vinte reais cada sessão, mínimo de dez sessões,
duzentos paus o pacote! É assim que funciona no universo feminino. É a técnica dos feirantes sobre as donas de casa.
A baciada sempre é mais atraente. Nunca queremos a unidade. Somos atraídas pelos pares, dezenas, dúzias, pacotes
completos, milhões. Entendeu? Paga-se adiantado as dez sessões! Eu fui lá para fechar as dez massagens, mas não
sabia que seria daquele jeito. Fiquei com os duzentos reais na cabeça e, na hora de fazer o cheque, foi tudo tão
rápido! Eu queria sair logo de lá, tirar aquele creme todo de mim, tomar banho, chutei o poodle. E ele gritava, ao
invés de latir direito como um cão normal. E todos os outros poodles começaram a latir, lamber a mulher do pires,
e…
– Calma. Conta do começo.
Contei tudo. Maridon riu, dormiu e eu fiquei na cama, olhando para o teto e pensando como é que eu faria no dia
seguinte para recuperar o meu cheque de duzentos reais.
_________________>>> Continua.